domingo, 17 de maio de 2015

POEMA PANORÂMICO





GELEIA GERAL

 Gilberto Gil

Um poeta desfolha a bandeira
E a manhã tropical se inicia
Resplendente, cadente, fagueira
Num calor girassol com alegria
Na geleia geral brasileira
Que o jornal do Brasil anuncia

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

"A alegria é a prova dos nove"
E a tristeza é teu Porto Seguro
 
Minha terra é onde o Sol é mais limpo
Em Mangueira é onde o Samba é mais puro
Tumbadora na selva-selvagem
 
Pindorama, país do futuro

Ê bunba iê iê boi
 
Ano que vem, mês que foi
Ê bunba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

É a mesma dança na sala
No Canecão, na TV
E quem não dança não fala
Assiste a tudo e se cala
Não vê no meio da sala
As relíquias do Brasil
Doce mulata malvada
Um LP de Sinatra
Maracujá, mês de abril
Santo barroco baiano
Super poder de paisano
Formiplac e céu de anil
Três destaques da Portela
Carne seca na janela
Alguém que chora por mim
Um carnaval de verdade
Hospitaleira amizade
Brutalidade, jardim

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi
 

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

Plurialva, contente e brejeira
Miss linda Brasil diz: "Bom Dia"
 
E outra moça também, Carolina
Da janela examina a folia
Salve o lindo pendão dos seus olhos
E a saúde que o olhar irradia

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

Um poeta desfolha a bandeira
E eu me sinto melhor colorido
Pego um jato, viajo, arrebento
Com o roteiro do sexto sentido
Faz do morro, pilão de concreto
Tropicália, bananas ao vento

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi
 

Ê bumba iê iê boi
Ano que vem, mês que foi
Ê bumba iê iê iê
É a mesma dança, meu boi

É a mesma dança, meu boi
É a mesma dança, meu boi




     Não sei por que, mas quando abro o jornal, lembro-me de uma citação de Ivan Lessa: “O brasileiro de 15 em 15 anos se esquece do que aconteceu nos últimos 15 anos.” A frase seria cômica, se não fosse desalentadora.
     Para quem não sabe ou não se lembra, havia uma coluna, no antigo e bom JB, intitulada Geleia Geral. Já a expressão “geleia geral” permaneceu com prazo de validade por mais algumas décadas.  E esta letra faz um tomada panorâmica da cultura dos 60.
    Que tal fazermos um poema que fotografe as faces múltiplas da última década?

     Afinal, é a mesma dança, meu boi.   

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