sábado, 30 de agosto de 2014

O REAL E O VIRTUAL



                                     Ricardo do Carmo

O HOMEM VIRTUAL


Como dentro do lar
coubesse a terra toda,
navego um mar de arquivos
e mundos aparentes.
Sou de todos os lugares,
menos de mim mesmo.
Eu não me concluo
e, fragmentado,
cada pedaço meu
é um inimigo.
Atravessando rios
que não molham,
chão que não piso
gente que não sinto
(lágrimas de cristal líquido),
vivo o que não vivo
como foda em fada.
E falando nisso
a minha namorada
é o meu computador.
O mouse
a extensão do meu carinho,
meu webtesão.
São tantas opções de sexo
para uma masturbação perfeita
que, sobre o teclado,
minhas mãos queimam excitadas.
E gozo de vocês todos.
Gozo desse mundo
que já não é tão grande assim
e cabe dentro do meu silêncio.
Navegando essa nau online
persigo meu artificial destino.
Como diriam antigos navegadores:
Navegar é preciso
Viver não é preciso.

Com base no poema de Ricardo do Carmo, escreva 
sobre a relação entre a literatura e a internet.  



quinta-feira, 28 de agosto de 2014

O TEXTO VENTRÍLOQUO





OS FOGOS DA FALA

a fala aflora à flor da boca
às vezes como fogos de artifício
fulguração contra os terrores do silêncio
só espada espavento espelho
ou pedra ficção arremessada
ou canção pra cantar as graças
as virilhas as maravilhas da amada
a deusa idolatrada de amor:
essa outra voz quase jazz
que subjaz ventríloqua de si mesma

Geraldo Carneiro

Faça um poema desenvolvendo a ideia de que há nele 
uma voz subjacente, o “autoventriloquismo”.




segunda-feira, 25 de agosto de 2014










Ricardo Alfaya





POETA EM GESSO

Num tresloucado gesto
escreveu um poema expresso
e quebrou o braço
A dor que deveras sentiu                                                                                                         
entortou-lhe a rima     
deixando-o em pedaços
No hospital lhe engessaram os versos
Em casa com a ponta dos dedos
rabiscou
poemas dispersos
No peito a ânsia
de que o tempo levasse para longe
o gesso de sua alma


Neste texto bem humorado, Alfaya trata das “dores da criação”
e termina com a metáfora “gesso da alma”, materializando 

o imaterial. Use o mesmo recurso em um poema.    



terça-feira, 19 de agosto de 2014

O POEMA E A EPÍGRAFE

                                                     Augusto Sérgio Bastos

Página virada

Ah, vida, porque pões asa
no sonho e não em quem sonha?
Afonso Felix de Sousa

O tempo se dobrou como a folha do dicionário.
E foi deixando marcas indeléveis.
À primeira dobra não dei importância.
Acreditei que um passar de dedos poderia alisá-la,
o próprio peso do papel iria corrigir o amassado.
Um dia, os sonhos foram perdendo altura
e soube que essas marcas nunca sumiriam.
Página virada, a ruga, hoje, faz parte do sorriso.


Faça um poema com base em uma epígrafe de um poeta contemporâneo
















sexta-feira, 15 de agosto de 2014

OFICINA LITERÁRIA NO SINPRO

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OFICINA LITERÁRIA
AGORA EM AGOSTO

ANÁLISE DE TEXTOS CONTEMPORÂNEOS
E CRIAÇÃO DE POEMAS, CONTOS E CRÔNICAS
LOCAL: SINPRO,  NA RUA PEDRO LESSA 35/3º ANDAR,
(PRÓXIMO AO METRÔ CINELÂNDIA)
DE 19 DE AGOSTO A 4 DE NOVEMBRO, 
DAS 9.30H ÀS 12H
PROFESSOR: MARCUS VINICIUS QUIROGA
VALORES:
R$ 222,00 - SINDICALIZADOS
R$ 294,00 – ASSOCIADO DE OUTRA ENTIDADE 
DE PROFESSOR OU PROFESSOR MAIOR DE 60
R$ 477,00 – NÃO SINDICALIZADO


MAIS INFORMAÇÕES: 3262-3440

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

POEMA DE CHRISTOVAM CHEVALIER

Comigo é assim

Com a grafia viva
de uma língua extinta
faço minha poesia.

Com o punho exausto
a alma em estado de alerta
assim faço minha poesia.

Criança rabiscando a esmo
afirmando calamidades
no escuro da noite em claro.

Assim faço minha poesia :
com indícios de talento
urgência de doente terminal.

   
    As oposições viva/extinta, exausto x alerta, e escuro x claro mostram a tensão do poema metalinguístico de Christovam. A poesia  não se quer calma, mas feita de calamidade, intenção bem expressa na imagem final, que desconstrói a ideia de poesia ser algo forçosamente agradável, com a lembrança de um “doente terminal”. Por outro lado, a sua urgência a faz necessária na (des)ordem do dia.


Marcus Vinicius Quiroga


domingo, 10 de agosto de 2014

DIA 5  (Ruy Maurity)

Numa noite clara, clara e macia
Quase madrugada, na beira do dia
O garçom atento, mal acostumado
Do lado de dentro, sempre de um lado
Você me querendo mais do que eu preciso
Mais do que eu entendo

Do lado de dentro, sempre à mesma hora
Na mesa do centro, do lado de fora
Eu queria tanto, precisava tanto
Pois sabia quanto eu não tinha nada
Quase madrugada calma e macia
Minha camarada.

Não sei, talvez amanhã eu não sou mais eu
De manhã nada aconteceu, aconteceu
Vejo a ilha rasa longe no oceano
Cada um pra casa com o seu engano

Rua tão vazia, vamos de mão dada
Na volta do dia, na volta do nada
O garçom sorrindo, já mudou a roupa
Mais um dia findo. 


Observemos a identificação de tempo (noite clara, madrugada, de  manhã, dia findo) e espaço (do lado dentro, na mesa do centro, pra casa, rua tão vazia) para situar o encontro de um casal. No entanto, é um texto de sugestões,que foge à mera descrição.  Temos o segundo momento da letra na terceira estrofe com os versos “Não sei, talvez amanhã eu não sou mais eu  De manhã nada aconteceu, aconteceu” , cuja força está nesta negação/afirmação. Que tal agora fazermos um poema com uma linguagem elíptica, dizendo e escondendo algo ao mesmo tempo?

Marcus Vinicius Quiroga



segunda-feira, 4 de agosto de 2014

O MAPA DA POESIA DE SALGADO MARANHÃO











LADRANTE    (Salgado Maranhão)

Ouço ladrar uma ausência
que rasteja:
loba
a rosnar
com a pata dos brutos.

Ouço com os dentes,
sinto com as unhas,
tangido pelo que
em mim
é instinto e êxtase.

Estou escrito
em muitos nadas
e bateram em minha porta
com um nome

que já não sou:
borda estrada
comida pelo deserto.

Posso estar louco
como a tempestade;
posso estar enfermo
como as utopias.

Mas grito na carne
uma acesa sanha de ser. 
Um raio de pernas ruivas

rasgou meu silêncio,
desde então sou somente
este abrigo de enredos.

Esta porta aberta aos pássaros.


 O grande poeta Salgado Maranhão acaba de lançar o livro
 O mapa da tribo, do qual retiramos este texto.