BALANGANDÃS
Tive anelzinho de ouro
com nome gravado na
chapa
(no azougue mudava de
cor)
Tive anelzinho de brilhante
pra usar no dedo
mindinho.
Pulseiras de pau-d’angola
com berloques e
sininhos
figa de marfim da índia
dente de onça encastoado
tive cordões trancelins
com santos bentos e
cruzes
amuletos pra
mau-olhado.
Argolinhas de prata
brincos
pérolas gotas
dançantes
montadas em marcassita.
Tive muitas medalhas
por prêmios escolares.
Colares de rosas saxe
e de miúdas
madrepérolas.
Um relógio Longines
pra...
nunca mais me
atrasar...
Perdi os balangandãs
todos sem sequer me
dar
conta e sem chorar
nenhum.
Não soube cuidar. Não
aprendi
a guardá-los fora da
lembrança.
Astrid Cabral
GUARDAR
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que um pássaro sem voos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
Antonio Cicero
Compare os dois poemas quanto ao conceito de guardar e faça um poema em que haja a diferença entre o material (a gaveta) e o imaterial (a lembrança), como no final do texto de Astrid Cabral.
Use um substantivo abstrato diferente de lembrança.
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