Nada é fixo. Estável.
Parado.
É preciso coragem
para inventar a vida
manter o equilíbrio
quando o mar picado
ameaçar o navio.
Não deixar-se cair ao mar.
Manter-se no pedestal
na inclemência do vento
nos tremores violentos
que sacodem o chão
onde se pisa.
Maleável, elástico,
acrobata, pisar
na corda bamba
e descobrir que é você
quem a agita.
Você é a máquina
que decide:
se vai parar ou seguir.
Dirce de Assis Cavalcanti
A autora acaba de lançar seu quarto livro de poemas pela 7 Letras, As linhas do vento, do qual retiramos este texto. Aqui também aparece o vento do título, que, além de ter as linhas normalmente incertas, tem agora a ameaça de sua força que tira as coisas do lugar e desiquilibra "tripulantes e navio". A afirmativa inicial e os vários infinitivos (inventar,manter, ameaçar,deixar, cair, manter,pisar, descobrir, parar e seguir)sugerem uma generalização de uma ideia, uma reflexão que diz respeito a todos.
Depois de uma premissa (Nada é fixo), vamos imediatamente para uma conclusão (É preciso coragem para inventar a vida). Mas o final desta conclusão (descobrir que é você quem a agita) leva de volta à premissa. Nada é fixo por sua causa. Isto é, você é também uma espécie de vento, pois é você mesmo quem agita a corda bamba.
Na última estrofe a imagem que mais nos agrada: o homem como uma máquina que decide. Máquina, porque as decisões se sucedem. Mesmo que você pare, terá que tomar uma decisão mais à frente.O uso poétido dos dois pontos interrompendo a oração subordinada bifurca a opção: parar ou seguir.E poderíamos ler também seguir por aqui, ou por ali, ou por...
A criação de um texto, seja um poema apenas ou um romance inteiro, é sempre também uma questão de livre-arbítrio. Escrever deste jeito significar não escrever de vários outros jeitos. Há sempre uma estrada escolhida, e a repetição desta escolha é que forma o estilo.
Se a vida é plástica, como querem alguns pensadores, e você, maleável e elástico,o vento não o jogará ao mar. Mas o desequilíbrio permanecerá, porque ele é inerente à condição humana. Entretanto, não se desespere: você é quem decidiu parar ou seguir, você é quem decidiu que fosse assim...
Como homem ou escritor, estamos sempre respondendo por nossos atos, por nossas palavas, enfim, por nossas decisões.Sigamos.
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