O PRAZER DE ESCREVER
Costumamos fazer referências nas primeiras aulas de oficina a um livro de Augusto Boal: 200 exercícios para o ator e o não-ator. Não só lemos com atenção como o utilizamos em aulas de artes cênicas há bastante tempo. Mas isto não vem ao caso. Interessa-nos o título que esclarece que os exercícios também podem ser feitos para o não-ator.
Explicitando a comparação, diríamos que uma oficina literária pode ser feita por não-escritores. Isto é, designaremos assim aqueles que escrevem, que gostam de escrever (e de ler, é evidente), mas que não ser pretendem escritores.
Deixaremos esta tarefa de “definir” o que é escritor par outro texto. Agora falaremos sobre o não-escritor: este é o escritor que vai a uma oficina aprender técnicas, exercitar-se, sem a intenção de publicação ou carreira; deseja o legítimo prazer da escrita e isto basta para ele.
Qualquer um que participe de grupos e encontros teatrais e faça exercícios propostos por Boal terá provavelmente prazer e satisfação em realizá-los no momento. E certamente estas horas dedicadas ao trabalho corporal, à integração social, ao exercício de confiança no outro, de análise, de observação, de memorização, de criatividade e de imaginação serão úteis para a sua vida, fora do espaço e do tempo das aulas de artes cênicas.
Recomendaríamos aulas de dramatização para a grade curricular de toda escola, não só por se tratar de uma arte, mas (opinião nossa) de ter uma serventia existencial para os alunos que talvez as demais artes não ofereçam.
Cremos que o mesmo acontece em uma oficina literária, só que de forma menos visceral, pois, por exemplo, seria menos provável a catarse lendo um texto do que vivenciando os sentimentos de um personagem.
De qualquer forma, lembremos que um não-escritor (como um não-ator) pode se interessar por uma oficina e dela tirar proveito. Este proveito não será convertido em livro, como os exercícios teatrais também não precisam necessariamente convergir para a montagem de uma peça.
Em outras palavras, a participação de uma oficina não precisa ter como objetivo o aprimoramento de sua linguagem, mas simplesmente a sua expressão e o prazer da elaboração de um texto sem fjnalidade específica.
Talvez o não-escritor não seja o frequentador típico de oficinas e nem sempre seja bem compreendido. Mas a experiência fez com que consideremos legítima a sua presença nas aulas de oficina. Até porque rara não é a surpresa de tempos depois (às vezes anos) o não-escritor apresentar uma obra mais consistente do que seus ex-colegas de turma.
Queremos dizer ainda que todo ator tem dentro dele antes um não-ator. E assim o escritor. Não nascemos atores ou escritores, mas podemos nos transformar em tais artistas.
Marcus Vinicius Quiroga
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