MELANCOLIA
Alvoroçada e desinibida,
debochada, arruaceira, a alegria
desfila seu samba-enredo pela avenida
na estridência de pandeiros
e tamborins.
Mágoas e aflições embarquem nessa viagem!
Animem-se macambúzios e sorumbáticos,
a alegria pede passagem,
suas tristezas chegaram ao fim.
Ai de mim que me espanto, abro caminho
e fico sozinho em meu canto.
Eu que sou assim desde meninno,
que amo o silêncio que no mundo existe,
que prefiro o dia nublado aos azuis,
o doce lamento dos saxofones
e dos violinos
à melancolia dos boleros e dos blues.
Que trago em mim esta alegria de ser triste.
Sílvio Ribeiro de Castro in 50 poemas escolhidos pelo autor (Editora Galo Branco)
Dias atrás postamos Confidência do itabirano, de Carlos Drummond de Andrade,onde encontramos os seguintes versos:"E o hábito de sofrer, que tanto me diverte/é doce herança itabirana." Agora no final do poema de Sílvio a expressão "esta alegria de ser triste". Em ambos os casos um contrassenso: Como se divertir com o sofrimento?
Como se alegrar com a tristeza?
Estamos diante de paradoxos linguísticos, mas que, poeticamente, fazem sentido ou passam a fazer sentido no texto. Se a subjetividade poética não os validasse, os sentimentos humanos e suas contradições o fariam.
No poema de hoje o fato de o paradoxo vir ao final do texto o valoriza, como se o texto se encaminhasse para esta confissão conclusiva, deixando ao leitor a reflexão
sobre tal verso.
Reparemso como o uso de certas figuras de linguagem (tão desdenhadas por parte da literatura so século XX)ainda surtem efeito. É claro que não devem ser usadas como enfeite, ornamento da linguagem, mas podem em 2010 ter funcionalidade estética.
Marcus Vinicius Quiroga
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